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quarta-feira, 21 de novembro de 2007

TEMPO_SERÁ ___Cacau Luik

Tarde morna agradável, é outono
benfazejo... vejo os moleques na rua,
soltando pipas, jogando bola...
inocentes arruaceiros.
Relembro os meus tempos de criança,
quando eu, cabelos curtos, sem blusa,
corria descalça pelo meu amplo quintal
de muitas árvores, colorido às vezes de rosa
pelas flores das paineiras, terreno cuidado
com tanto esmero pelo meu falecido pai,
ou então quando corria pelas ruas de minha
modesta cidade no ir e vir da padaria em busca de
pão doce para as tardes do Sítio do pica-pau Amarelo.
Tempo em que quem não me conhecia
perguntava-me se eu era menina ou
menino... eu respondia: sou criança ora,
para brincar não é preciso mais que um short,
e eu, nós corríamos em bando, polícia-ladrão,
pique bandeira, esconde-esconde, jogávamos
futebol, bola de gude, queimado, pulávamos corda,
amarelinha, também ensaiávamos quadrilha...
Ah! Que saudade que eu tenho das minhas férias de junho!...
Tinha uma avó que morava perto, tias
também, primos e primas, mas, aqui
entre nós, pois será segredo nosso,
eu tinha a minha avó preferida; esta
morava mais longe, tinha fala mansa,
gestos tranqüilos, mãos pequeninas,
gordinhas, pele muito curtida pelo tempo,
pela vida, puro doce de gente,
que nos fazia guloseimas e nos permitia ler
trechos da bíblia e chamava-se Maria Elisa.
Contava-nos causos, histórias de tempos remotos,
quase lendas, fantasiosas narrativas em que nós
sempre acreditávamos, o pai dela fora escravo,
foi liberto muito jovem pela
pena de Isabel que também era Maria,
tinha tantos contos ele que passou a minha avó
quando ela ainda era pequenina.
Sua mãe fora uma índia que lhe ensinou
muitas rezas que ela guardava em segredo,
várias vezes a vi rezando, além de mim, minhas
duas irmãs menores... ventre virado, cobreiro,
quebranto, suas frases balbuciantes sempre
voltam aos meus ouvidos.
Quantas vezes passei minhas férias na
casa onde ela morava e junto dela uma tia,
meia irmã de minha mãe, chamada Maria Inês,
a outra mãe de dez filhos chamava-se
Maria Albertina, minha boníssima mãe, mulher
que deu seis crias e chama-se Helena Maria...
Às vezes acho que perdi muito tempo, entretida em
brincadeiras, às vezes acho que o tempo é que se
perdeu em mim e ainda não o encontrei, distraiu-me,
brincou comigo, com a minha querida avozinha,
com meu amadíssimo pai.
Tempo, tempo!...Por que fizeste conosco este gracejo?
Jogou comigo sem que este fosse o meu desejo...
Bicho-papão malfasejo brincou de tempo-será!...

Cacau Luik Junho 2004

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