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quinta-feira, 3 de maio de 2012

LÚCIA de FÁTIMA MARQUES PERES



Lúcia Peres é escritora desde os tempos de escola.Seus pequenos ensaios poéticos,eram admirados pelos que a cercavam.Menina valente,destemida,sempre a frente de seu tempo.E admirada por isso.
Jandaiense (Jandaia do Sul -PR) e hoje radicada em Campinas.Lúcia continua seu caminho literário,desnudando sua alma em suaves palavras,que hora nos fazem sorrir e outras SAUDADES!

O PROF. FREDI É NOSSO HERÓI___LÚCIA de FÁTIMA MARQUES PERES

O PROF. FREDI É NOSSO HERÓI


Num janeiro escondido da vida chego de mansinho... Vou lentamente descobrindo lembranças adormecidas, enquanto uma poeira fina acumulada ao longo do tempo vai dançando no ar. Esta, desafia meus olhos que resistem em abrir as janelas do tempo...
A claridade desconforme das candeias, iluminam trazendo de volta um mundo distante, colorido pela alegria de uma infância feliz, pintada pelas cores dos tempos de escola...
É... Quem ainda lembra daquele cheiro tutti fruti nos materiais escolares, dos livros e cadernos encapados cuidadosamente com plástico, lápis de cor, as canetinhas porosas, a cola, o apontador...
Livros com páginas eternamente amareladas e inesquecíveis, condensam risos e gargalhadas...
Um cheiro marcante da cantina pelos ares; aguça os sentidos e revela ora pelo aroma salgado, ora pela doçura, sabores como dos sonhos, da cocada baianinha ou até mesmo do quebra- queixo e daquela tão apreciada pipoca do seu Dito.
O que minha tela plana projeta depois de meses intermináveis e tão longínquos, vem misturados ao aroma e o frescor do verde oriundo das árvores, que emolduram os fundos do colégio. Lindas, frondosas, dançam com seus galhos e festejam todos que ali estão. De um lado, sob o olhar da professora, as meninas fazem aquecimento, preparam músculos e liberam alegria, para movimentos mais drásticos na ginástica do dia. Enquanto umas reclamam, outras extravasam e se divertem, mas há ainda aquelas mais resistentes, que agem forçadas pela obrigação.
Ao fundo, mais distantes estão os meninos. É possível ouvir os chutes que explodem na bola, enquanto o apito do professor vai regrando o jogo. E correm e caem, e miram, e usam táticas pra levar a bola para o gol. Enquanto o professor vai cobrando regras, uns reclamam, outros enfurecem ou ainda alcançam o topo da glória,vibram e festejam cada jogada.
As lembranças vão dançando dentro de mim, chacoalhando vidas que estavam escondidas num tempo, que estavam lá, quietas e adormecidas no passado...
Tempos de escola... Tempos da educação plena: do corpo e da alma. Mentes tão felizes em corpos regados pela beleza sadia da adolescência. Meninos e meninas vivendo num tempo cuja receita foi esquecida em algum lugar...
Meus olhos fazem um esforço descomunal, resistem a pororoca, mas à medida que as imagens vão sendo reveladas, mais e mais, o inevitável acontece... A ressaca de Assis toma conta...
Enquanto as meninas domam músculos e medem força no salto, os gritos vindo da direção da cancha dos meninos, agora, atestam desespero, sabor amargo salpicado pelos gritos de horror. Corremos todas para ver de perto o que motiva tão grande trovoada em plena tarde ensolarada. É Tatuí. Ele tinha nome e sobrenome, mas a habilidade em assobiar com as mãos emitindo um som peculiar, levara a ser conhecido como Tatuí.
Tatuí! Tatuí! Tatuí! Tantos gritos, todos gritam desesperadamente... Tatuí é da 5ª F, sala dos meninos. Na reserva, aguardava na torcida sua vez de jogar. Enquanto os colegas goleavam com a bola ele goleava com a pipoca, até bater em sua própria trave.
Tatuí está engasgado. Minha nossa, quanta confusão! O professor tenta, vira, revira, faz safári na boca de Tatuí, faz de tudo e nada. Não adianta, Tatuí não responde. Está engasgado com pipoca. Em choque, estamos todos ali. Tatuí não pode morrer.
O professor corre, salta o muro sem perca de tempo, cerca o primeiro que passa num veículo: um caminhão. Tatuí é carregado para cima da carroceria. Seguem juntos, professor e alguns amigos. Levam para o hospital, socorro certo.
Depois da tensão Tatuí fica bem e todos ficam aliviados.
Fim da aula, fim da educação física, fim do esforço físico e espiritual do dia.
Naquele dia incerto empoeirado pelo tempo, fica impresso na História: O PROF. FREDI É NOSSO HERÓI.

Por Lúcia de Fátima Marques Peres
Tempos de Escola XXV

A CRIAÇÃO ESTÁ NA U.T.I____LÚCIA de FÁTIMA MARQUES PERES

A Criação está UTI



Absorta, observo as gotas minúsculas que vão caindo e escorrendo pela vidraça. Algumas respingam em mim e vão umidecendo meus pensamentos. Estes, me levam pra longe, numa viagem de uma vida inteira...
As imagens que vão surgindo, refrigeram a minha alma, e uma chuva mais intensa continua caindo dentro de mim. A mesma que vai impulsionar o monjolinho, caprichosamente arquitetado e assentado, a beira do riacho de águas cristalinas e tão mágicas. E o toc toc , bate ecoando felicidade pelos ares... Lá está para sempre o menino, mestre da engenhoca, habilidade que herdara de seus ancestrais.
A chuva continua... As águas saem de seus esconderijos. Algumas espreitam timidamente tudo ao redor... O céu não está cinzento, mas também não está azul como nos dias ensolarados...
E as águas passeiam... Escapam e somem pelas veredas... Ressurgem nas manhãs orvalhadas, perfumadas pela essência da terra. As mais apressadas apostam corrida, desafiam as escarpas e os rochedos, deixando pelo caminho notas musicais de todas as cores... Entre arbustos e arvoredos, se aninham nos leitos dos rios, nos lagos e lagoas... A mesma, que vai banhar as crianças candidatos à puberdade. Estas saltam os penhascos sem medo e desvestidas de juízo. Vestindo apenas a adrenalina da meninice feliz. Mergulham fundo, dentro delas mesmas. Para estas, talvez seja a única diversão da semana. A piscina sonhada, lá é generosa oferenda da mãe natureza, que sem cobrança, não apenas as contempla, como também as afaga. As gotas que de seus corpos inocentes escorrem, escoam pelo ralo da terra, e prosseguem numa missão incansável... Missão de idas e vindas, de juntar anos e separar milênios... Missão de regar a criação.
Meus pensamentos vão ficando encharcados... Molhados pela alegria de correr pelos quintais. Enquanto as roupas rodopiam ao vento nos varais, as árvores dançam lambada e as nuvens tentam se esconder do vento. Balançam, balançam e se movimentam freneticamente.
É festa no céu. É festa na terra. A mesma que sustenta os cafezais, os canaviais e tantas outras plantações.
A vida está sendo molhada. Quantas felicidades!
E a chuva cai. Vai molhando o chão batido, o chão pisado pelo gado, os trilhos da linha férrea e a estrada também. Outras, invasoras, vão chegando sem nem mesmo pedir licença. Assustadoras, avançam os quintais ao som dos vendavais. O rio transborda. Os bueiros também.
Tingida por tons escuros, não mais insípida, não mais tão bela.
Toma posse. Traz de tudo um pouco. Deixa lixo, deixa lodo, deixa gravetos e os galhos...
Galhos verdes, galhos secos, galhos molhados de fome e encharcados de tristeza.
O dia chora. As crianças também. Não é dia de brincadeira.
O céu que assiste tudo convida o sol: É dia de mutirão. É preciso insolação.
O trem precisa trafegar nos trilhos de ferro, nos trilhos da vida também.
Partem as águas intrometidas, cuja missão era alagar e também alargar os sentimentos de partilha nos corações caatingueiros.
O entardecer traz o vento. Uma pipa minúscula o convida para brincar. É preciso distrair as crianças.
A natureza levou as águas para algum lugar... Mas qual? Em qual esconderijo estaria?
Em quanto isto, a criança definha... Sonha com a panela cheia, com o horizonte transbordando, com a água escorrendo fria pela testa, pelo relevo humano. Seus olhos choram secamente, estão áridos, querem o colo tranqüilo das águas. Águas do São Francisco, das serras tão longe dali, do outro lado do mundo...
Do outro lado do mundo? No outro lado do mundo...
E as águas que estavam dormindo, acordaram assustadas, com solavancos no berço, sem tempo de reação. O chão treme. A maresia foge. A terra geme. As florestas tombam. As geleiras sucumbem. Os oceanos espasmam em cólicas. O mar vomita fúria, deixando marcas e o gosto do fel. Deixando ainda, mais um sinal de alerta: Depressa, o doce lar está ficando salgado. A Criação está UTI.

Campinas 19/03/2011.
Por Lúcia de Fátima Marques Peres

O AMANHECER____LÚCIA de FÁTIMA MARQUES PERES

O AMANHECER
Amanhece...
Desperto abrindo minhas janelas. Cortinas se abrem vagarosamente...
A embriaguez do último sono ainda parece querer me dominar.
Fico imóvel.
Ao fundo, as primeiras notas se mesclam, ao som que parece sumir longe...
A melodia dos poucos pássaros que ainda resistem e por aqui passeiam, invade e caprichosamente penetra em minha alma.
Totalmente entregue, me desprendo do leito tão acolhedor.
Quero abraçar o amanhecer que me chama. Quero dar boas vindas para o dia que está chegando.
Meus passos me levam agora para uma grande tela. A janela é aberta, as cortinas também.
E agora já não são mais as cortinas sonolentas de meus olhos.
Lentamente, estes filmam o horizonte que se perde no infinito e se mescla com o céu, que lá, parece salpicado por uma névoa incerta...
A tela de DEUS e a dos homens aparece diante de mim.
Tão definida e ao mesmo tempo tão amalgamada...
Vejo milhares de telhados, colocados caprichosamente sobre o relevo de nossas campinas.
Penso que neles, muitos ainda estão adormecidos. Terminando seus últimos minutos de sono e de sonhos... Ou quem sabe, simplesmente apenas começando...
A mesma tela que outrora, uns quinhentos janeiros quem sabe, era tão diferente...
Talvez mais definida pelo verde dos campos e o azul celestial...
Ouço uma música um pouco mais intensa, que me traz de volta pra realidade.
A orquestra ainda está em aquecimento, com instrumentos diversos, num vai e vem,
que com o passar dos minutos vai intensificando cada vez mais...
Ao longe, a perder de vista, um instrumento que é o maior e mais intenso,
E que minha audição é incapaz de alcançar, decola rasgando os céus. Certamente levando tantos outros sonhos...
A vida pulsa. A cidade acorda para o sonho real.
Meus olhos continuam apreciando a grande tela: a de DEUS e a dos homens.
Homens de todos os lugares, de todos os brasis, de tantos outros continentes...
A brisa fresca de verão ainda passeia, enquanto os galhos das árvores parecem reverenciar o dia que chega. E os tantos telhados perdidos ao longe, acomodam os nativos e os imigrantes, sonhadores e desbravadores.
Dos dias cinzentos, tirei todas as cores para pintar meus sonhos, para pintar minha tela.
Eu estava lá, mas agora estou aqui.
Em contemplação, peço pelas crianças de todas as idades. Pela Campinas querida, que generosamente abraça e acalenta a cada amanhecer...
Que bom sonhar, que bom sempre acreditar, que bom ter fé!
O amanhecer traz de presente, a chance de sempre renovar e conquistar.
Traz também, o privilégio de não só contemplar, mas também compor e compartilhar a grande tela: O AMANHECER.
LÚCIA DE FÁTIMA MARQUES PERES
12/01/2011